domingo, 27 de setembro de 2009

A ESCOLA ATRAVÉS DOS TEMPOS

A ESCOLA ATRAVÉS DOS TEMPOS

Autora: Antônia Sales – Letras/UECE
antonia_saless@hotmail.com

Ao caminhar pela cidade, observando seus prédios, é fácil saber quando se está diante de uma escola, isso porque a escola é uma das instituições sociais mais importantes. Torna-se assustador imaginar que todas as pessoas passam em torno de quinze anos de suas vidas freqüentando esse espaço. E é interessante perceber que a história da escola e da educação acompanha todos os estágios da evolução humana, desde a forma de educação primitiva, mais informal, até o modelo de educação ministrado na escola atual.
Talvez por isso, ela é tida como o espaço de concretização e assimilação do conhecimento. Analisando-a do ponto de vista do contexto histórico, surgirão muitos questionamentos a respeito da atuação dessa instituição.
O ambiente escolar sempre existiu? Qual a nossa verdadeira função como educadores? Quem tem direito à educação? Quem é o sujeito da educação? Somo formados para servir à quem? Devemos desenvolver o que? Será que no nosso período de formação somos levados à refletir sobre o papel da escola e o mundo que nos cerca? Como podemos atuar de forma ativa e transformadora? Será que é só na escola que se dá o processo educativo? Qual a relação entre ambiente escolar e estruturação do pensamento?
A educação nas comunidades primitivas era um ensino informal e visava um ensino das coisas práticas da vida coletiva, focada na sobrevivência e perpetuação de padrões culturais, ou seja, não havia uma educação confiada a uma instituição específica., porque ela acontecia espontaneamente mediada pela convivência em grupo. É o aprender fazendo, inter-relacionando vida e trabalho nesse processo.
Com a conquista grega é que vem toda uma revolução na tradição do ensino, passando a ser vista de uma maneira mais racional.
O termo escola vem do grego scholé significando “lazer, tempo livre”. Esse termo era utilizado para nomear os estabelecimentos de ensino pelo fato de a tradição greco-romana não valorizar a formação profissional e o trabalho manual. Formar o homem das classes dirigentes era o ideal da educação grega. O professor não deveria ensinar de acordo com suas concepções, mas de acordo com a exigência da sociedade, devendo formar os futuros governantes e ocupantes dos altos cargos. O mestre filósofo era o responsável pela educação dos seus discípulos, em geral cinco e geralmente ensinava política, artes, aritmética e filosofia.
Na Idade Média, o conhecimento ficou praticamente nos mosteiros. È aí que a educação ambienta-se na escola e os religiosos se encarregam da transmissão do saber. Era ainda uma educação elitizada, não havendo separação entre crianças e adultos. Os nobres só se preocupavam em aumentar suas riquezas, e acreditavam até que o escrever era próprio para as mulheres, portanto desprezavam a cultura e a instrução. Com o desenvolvimento do comércio é que surge a necessidade de aprender a ler, escrever e contar. A burguesia estimula uma escola com ensinos práticos para a vida e para os interesses da classe emergente. Portanto, o aparecimento da instituição escolar estar diretamente ligado ao aparecimento e desenvolvimento do capitalismo. Percebemos isso claramente ao notar que no período da Revolução Industrial ( a partir de 1750), época áurea do sistema capitalista, houve a necessidade de mão-de-obra para operar as máquinas e que para tal manejo teriam que ter no mínimo uma instrução básica. A burguesia percebeu que a educação serviria para disciplinar esses milhares de trabalhadores. Adam Smith,um dos grandes teóricos do Capitalismo, inclusive defendia que a educação era necessária e deveria ser dada em pequenas doses às massas.
Portanto a burguesia viu na educação uma poderosa arma de controle para disciplinar os trabalhadores. Vemos aí que a Escola surge com funções ideológicas: inculcar na grande massa os valores e normas da classe dominante, mostrando a função de cada um conforme sua classe de origem.
Tal posição não é vista claramente pela massa, porque a Escola sempre é vista como uma instituição neutra que trata a todos de forma igual. Nunca se reflete sobre seu atual papel, o que de certa forma esconde a realidade da maioria.
Pelo que foi dito acima, conclui-se claramente o poder que a escola tem de disseminar o pensamento ideológico de quem comanda a sociedade. Ou seja, o aparelho escolar está a serviço da classe que controla a sociedade.
Os jesuítas criaram as primeiras escolas quando aqui chegaram em 1549, com o objetivo de formar sacerdotes e catequizar o índio, dedicando-se também à educação da elite nacional.A Companhia de Jesus foi uma instituição criada essencialmente para fortalecer e defender a Igreja. A Companhia demorou 59 anos para formular o seu plano de atuação – O Ratio Studiorum, finalizado em 1599 e totalmente influenciado pela cultura européia e considerado um perfeito instrumento de controle. Ou seja, privilegiavam uma cultura intelectual idealizada em nome da Igreja, em detrimento da emancipação intelectual.
Na Alemanha e na França é que se inicia a educação pública estatal, porém, sem o interesse de atender aos filhos da classe trabalhadora. No séc. XIX ela é inaugurada nos EUA e no Brasil no final do séc. XIX quando principiou o processo de industrialização do país.
No Brasil, para uma melhor compreensão da atuação da escola, fundamental é falar das tendências pedagógicas. Lembrando que nenhuma teoria ou método pedagógico é neutro, pois está enraizado no momento histórico, econômico e político na qual é formulado.
No século XX, no Brasil construiu-se um ideal de sociedade do lazer ancorado na ilusão do mundo de consumo, surgem os movimentos de contra-cultura( beatniks, hippies, punks); os movimentos de mobilização das minorias( movimento estudantil, feminista, grupos de defesa dos direitos humanos) e o surgimento das ONGs. Todas essas mudanças exigiram um novo tipo de escola, principalmente uma escola pública, leiga, gratuita e obrigatória devido à vertiginosa industrialização.
No Brasil, a educação só passou realmente a ser debatida no início do século XX a partir das discussões surgidas com os intelectuais brasileiros que passaram a analisar a educação de forma mais profunda. Tal análise começou como o movimento escolanovista na década de 20, que surgiu como uma crítica à educação tradicional, buscando acima de tudo a universalização do ensino no país. Preconizava ainda uma nova escola, onde o aluno passasse a ser ouvido e defendendo uma escola que formasse um homem novo.
A partir desse movimento surge o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932), documento assinado e liderado por Fernando de Azevedo e com apoio de Aluízio de Azevedo, Anísio Teixeira, Cecília Meireles e várias outras personalidades.
Tal manifesto surgiu porque não havia ainda um sistema escolar adequado ao país, dando uma forma mais racional à educação, cientificando-a.
Nos anos 60, surgem movimentos contra a escola, propondo a desescolarização, e uma crítica ferrenha à escola, surgindo uma nova concepção. A escola passa a ser vista sob a perspectiva de reprodutora das desigualdades da sociedade.
Dermeval Saviani, um dos grandes teóricos da educação, classifica as teorias educacionais em teorias críticas e não-críticas. As teorias não-críticas entendem a educação como uma ferramenta de equalização social, de superação da desigualdade social, vista de forma autônoma em sua atuação, e ao tentar entendê-la partem dela mesma. Como exemplos de teorias não-críticas temos a pedagogia tradicional( preconiza o professor como centro do processo de ensino e ao aluno cabe aprender o que lhe é transmitido, sem ter o direito de questionar, preconiza o “aprender”), a pedagogia nova( defende a escola como um meio de equalização social, enfatiza o “aprender a aprender”). Daí vem o escolanovismo. Propunha uma ampla modificação na aparência das escolas, com salas de aula de aspecto mais agradável e mais alegre. A partir daí surge a pedagogia tecnicista, já que a pedagogia nova não conseguiu seu intento. A última das teorias não –críticas é a pedagogia tecnicista que enfatiza o “aprender a fazer” e tem como objetivo tornar o processo de ensino mais operacional, formando homens competentes e produtivos.
As teorias acima representam um processo de reorganização do aparelho escolar que passou por um intenso processo de burocratização. Essa fragmentação no trabalho pedagógico causou um caos no campo educativo por tentar comparar a educação com o sistema fabril.
Quanto às teorias críticas, elas são também denominadas de teorias crítico-reprodutivistas, pois são compreendidas a partir da influência da sociedade a qual servem. Portanto, há uma estreita relação entre educação e sociedade. Entre essas teorias Dermeval Saviani cita: a teoria do sistema de ensino enquanto violência simbólica(como exemplo temos a violência material imposta pela classe dominante à classe dominada, o que provoca uma violência cultural, o que vemos claramente na ação pedagógica institucionalizada, ou seja, no sistema escolar).
Uma outra teoria crítico-reprodutivista é a teoria da escola enquanto aparelho ideológico de Estado, que Althusser bem distinguiu em Aparelhos Repressivos de Estado(a Polícia, os Tribunais, etc.) e os Aparelhos Ideológicos de Estado(a igreja, a família, os sindicatos, as escolas, etc.).Esses aparelhos ideológicos espalham a ideologia dominante, de forma não institucionalizada, mas de forma massiva e ideológica, já que a escola serve como instrumento de inculcação do pensamento da classe dominante. Para isso, ela prepara durante vários anos as crianças provenientes de todas as classes sociais e as transmite a ideologia da classe dominante, reproduzindo assim as relações de exploração do sistema capitalista.
A teoria dualista é a última teoria crítico-reprodutivista. Esta teoria acredita que a escola é dividida em duas camadas ou classes: o proletariado e a burguesia e que essa divisão está presente em todo o conjunto escolar, desde a primária até a secundária. Tal teoria entende que a escola cumpre a missão de formar a força de trabalho pra atuar no sistema, contribuindo para a reprodução das relações produtivas. Ela reconhece que existe uma ideologia proletária, mas que a ideologia proletária não está na escola.
Através dessas teorias conclui-se que as teorias não-críticas não conseguem bons resultados, por distanciarem a educação da realidade do aluno e as teorias crítico-reprodutivistas explicam o porquê do fracasso escolar.
Comenius ( Jean Amos Komenisky – 1592 – 1670), considerado o pai da didática, considerou a escola como o espaço fundamental da educação do homem, estruturando seu pensamento na máxima: Ensinar tudo a todos. Para ele, essa educação concebida em um ambiente adequado, com diálogo e através da experiência é que formaria cidadãos capazes e atuantes no mundo. E Comenius acredita na escola como uma aliada nesse modelo de construção do saber.
Maria Montessori, representante da Pedagogia Nova, a partir de experiências com o ensino de crianças, conclui que o espaço ideal para ser uma escola é uma casa com um jardim cultivado pelas crianças, com liberdade onde as crianças aprendem e se desenvolvem sem a ajuda dos adultos. Já que para Montessori, o ambiente adulto se torna um obstáculo para o desenvolvimento das crianças. Assim, preparando-se um ambiente adequado aos movimentos das crianças, ocorrerá a manifestação psíquica natural e portanto um aprendizado saudável.
Para Paulo Freire, grande expoente da educação brasileira, a escola é o espaço onde se dá o diálogo entre os homens, mediatizados pelo mundo ao redor, surgindo daí a necessidade de transformação do mundo. “ Não devemos chamar o povo à escola para receber instrução, postulados, receitas, ameaças, repreensões e punições, mas para participar coletivamente da construção de um saber, que vai além do saber de pura experiência feito, que leve em conta as suas necessidades e o torne instrumento de luta, possibilitando-lhe transformar-se em sujeito de sua própria história(...) Freire, 1980. Freire considera a escola como um espaço político para a organização popular.

Numa perspectiva realmente progressista, democrática e não–arbitrária, não se muda a “cara” da escola por portaria. Não se decreta que, de hoje em diante, a escola será competente, séria e alegre. Não se democratiza a escola autoritariamente. A administração precisa testemunhar ao corpo docente que o respeita, que não teme revelar seus limites a ele, corpo docente. A administração precisa deixar claro que pode errar. Só não pode é mentir. (Freire, 1980)

No século XXI, a escola enfrenta um dilema. Com o grande avanço tecnológico, a era do computador, surge o desafio: seguir uma formação intelectual ou uma formação profissional?
As promessas que foram feitas no séc. XIX, para a implantação de uma escola pública e universal não se cumpriram de fato. O modelo da escola tradicional sofreu inúmeras críticas nos últimos tempos. Como enfrentar tais desafios na atual estrutura da escola?

Nenhum comentário:

Postar um comentário